PAINEL 6: Maiorias Minorizadas

Aberto o painel de “Maioria Minorizadas”, pela Mediadora Dra. Melina Fachin, que agradeceu a presença, especialmente de mulheres potentes e que são referência para as demais, em um painel voltado para discussão de gênero. A Dra. Melina iniciou dizendo que, embora nossas instituições políticas sejam neutras, isso acaba favorecendo sujeitos de direitos masculinos, tanto na aplicação do direito, como na ocupação desses espaços jurídicos de poder. A partir disso, questionou como, dentro da vivência de cada uma, essa discriminação de gênero é percebida.

Com a palavra, a Dra. Kari Guajajara cumprimentou a todas em sua língua materna, informando que temos 275 línguas espalhadas no Brasil para além do português. Indo adiante, tentando responder ao questionamento da Dra. Melina, a Dra. Kari afirmou ser importante não olhar as situações de forma isolada, sendo preciso olhar que o patriarcado, a misoginia e o machismo têm raízes históricas, de modo que hoje se tem carreiras formadas exclusivamente por homens na posição de poder em razão disso.

Fazendo um recorte das carreiras jurídicas e da advocacia, a Dra. Kari Guajajara ressaltou que não é possível que um país majoritariamente composto por indígenas e mulheres ainda tenha os maiores cargos de magistério e de decisões compostos por homens, relembrando o fato de nunca ter havido uma ministra indígena no STF, e de somente haver uma mulher. Nesse ponto, a Dra. Kari disse que a OAB tem responsabilidade nesse cenário.

De todas as injustiças vividas, a Dra. Kari ressaltou que a questão de equidade de gênero é a que mais se destaca, sendo um cenário que precisa de incentivo e políticas públicas, uma vez que não é somente com o curso natural que a situação será alterada, de modo que esse processo de diálogo se mostra essencial.

Devolvendo a palavra à Dra. Melina, ela relembrou que dados das Nações Unidas indicam que nós temos séculos de luta para que essa equidade seja alcançada, passando em seguida a palavra à Dra. Lilian Azevedo, que relembrou que, embora ocupe o cargo de Procuradora do Município de Salvador, é ela exceção. Não obstante, estando lá, ela angaria força e poder para que mais mulheres ocupem espaços de destaque.

Destacando a questão de gênero, ressaltou ser importante diversificar o olhar para a palavra “mulher”. Inicialmente, sair da ignorância, visto que antigamente esses temas, na época em que fez faculdade, sequer eram citados, e o fato de se discutir amplamente sobre esses temas hoje, ainda que na lógica teórica, já é um avanço.

A Dra. Lilian ressaltou que é necessário trazer essas discussões para uma lógica vivencial, pois percebe que, mesmo ocupando espaço de poder, qual seja, a procuradoria do município, são reproduzidos discursos e atitudes discriminatórias, o que advém do próprio direito que foi gestado numa lógica machista.

Devolvendo a palavra à Dra. Melina, esta ressaltou que embora as mulheres sejam de fato discriminadas, elas não são discriminadas de forma igual, sendo que as mulheres indígenas, negras e trans, que têm outro marcador de vulnerabilidade, as colocam em uma situação ainda mais delicada. A partir disso, destacou ser essencial analisar a interseccionalidade entre as mulheres, ao que questionou as palestrantes, dentro do local de fala de cada uma sobre isso.

Iniciando com a Dra. Lilian, esta relembrou sobre o contexto em que a Lei Áurea foi implementada, em especial o que aconteceu com a população agora “liberta”, que passou a ser a primeira população em situação de rua, e que foi para as comunidades, saindo de lá somente com grande dificuldade. Diante disso, ressaltou a necessidade de se pensar em propostas para mudar a realidade dessa população, vítima de um racismo institucionalizado.

Em seguida, a Dra. Kari ressaltou que pensar a advocacia indígena hoje é pensar em construções de pontes entre o Judiciário e os povos que constroem esse país. Inúmeros foram os desafios relatados pela Dra. Kari, informando que se faz necessário analisar a perspectiva indígena à luz da Constituição Federal, em especial em seus artigos 2º e 3º.

A Dra. Melina relembrou a recente discussão do CNJ em relação à paridade de gênero para promoção por mérito, visto que esse sistema de promoção leva sempre em conta a antiguidade, dentre outros requisitos, que acabam inconsequentemente beneficiando apenas os homens. Ainda, relembrou que já se tem uma resolução de que é dever do Poder Judiciário brasileiro julgar com perspectiva de gênero, o que decorre de uma condenação da Corte Internacional pela morte da Marcia Barbosa, tendo seu assassino se valido da sua imunidade parlamentar para se refugiar da responsabilização.

Para responder o que significa julgar com perspectiva de gênero, foi passada a palavra para a Dra. Kari, dizendo que é uma grande falácia dizer que exista um cenário de imparcialidade a ponto que suas vivências não venham a influenciar no teor daquilo que julgará, porque tudo que o forma como ser humano, em alguma medida, influenciará nas decisões que se tomará. Assim, na sua visão, é difícil acreditar que homens possam julgar com imparcialidade, respeito, e considerando toda essa diversidade.

Logo, é necessário continuar insistindo para que nas cadeiras de poder tenham pessoas diferentes, com pensamentos diferentes, mas que tenham essa visão de diversidade. Disse, ainda, que diversidade é a solução e não o problema, e que somente poderá dar uma resposta satisfatória quando essas cadeiras forem ocupadas com diversidade.

Ao fim, a Dra. Lilian disse que, primeiramente, é preciso entender que o direito não dá conta disso sozinho o, que é necessário se conectar com outras fontes de poder para avançar, se alinhando com outras vozes, com a sociedade civil, com o terceiro setor.