Painel 7: Ativismo Judicial

Iniciando a exposição do painel, o Dr. Daniel Sarmento indicou que o termo “ativismo judicial” foi criado para criticar a Suprema Corte Americana e os excessos a ela atribuídos. Sarmento, no entanto, expôs a preferência pelo uso da expressão em caráter neutro para denotar a postura mais ativa das Cortes, em circunstâncias mais ou menos adequadas.

Desde o início, o painelista esclareceu que o ativismo judicial não é uma singularidade brasileira, tampouco um fenômeno que teve a sua gênese na Constituição de 1988; até porque, explicou, o tema era discutido no país desde a República Velha. Nessa época, contudo, a crítica à Suprema Corte era muito mais por omissões do que por excessos.

O painelista defendeu que a existência de uma corte independente para fazer valer o texto constitucional, a despeito de governos de ocasião, é imprescindível para a supremacia da Constituição, sobretudo quando houver um processo político não suficientemente inclusivo, em que uma das funções jurisdicionais mais relevantes é a de proteção das minorias e de seus direitos – os eternos “perdedores políticos”.

O palestrante acrescentou que o papel da jurisdição constitucional é especialmente relevante em contextos de crise democrática – momento em que, nos últimos anos, segundo ele, o Supremo desempenhou um bom papel. Isso sem deixar de lembrar que adotar decisões contramajoritárias é papel do Supremo, notadamente para a proteção dos direitos das minorias.

Em tom crítico, contudo, Sarmento advertiu que a atuação de contenção do Supremo em defesa de direitos fundamentais não pode se travestir em política partidária. Prosseguiu, ainda, com o alerta sobre como a politização da política é um problema tanto jurídico, quanto político – mormente quando o comportamento dos Ministros exibe excessiva e indevida proximidade com agentes políticos e econômicos.

A esse respeito, Sarmento ainda tratou dos riscos que a chamada promiscuidade entre o Supremo e agentes políticos representam, até mesmo, para a legitimidade da Corte – com ênfase à percepção pública sobre essa relação. Ainda assim, defendeu que o STF tem mais acertado do que errado, principalmente nas causas relativas a direitos fundamentais.

Na sequência, a palavra foi passada ao segundo palestrante, o Dr. Gustavo Binenbojm, que afirmou que a Constituição Federal é o estatuto jurídico da democracia e que o ativismo judicial é necessário para uma democracia madura, mas sempre dependendo do caso e das circunstâncias. Defendeu ser necessário levar a Constituição Federal a sério e sobretudo ter um órgão de controle independente que possa garantir não somente as regras do jogo, mas também os direitos fundamentais das minorias.

Postas essas considerações, frisou que, no contexto brasileiro, a judicialização tem assumido em algumas situações um caráter quase dramático, principalmente em relação à judicialização de assuntos cuja discussão deve se ater ao campo das políticas públicas e, ainda, da alta política.

Discorrendo sobre a judicialização no plano das políticas públicas, o primeiro problema levantado foi o de que o judiciário, na sua essência, é criado para resolver problemas intersubjetivos. Assim, quando se transfere a responsabilidade de formação e implementação de políticas públicas para ele, há sempre a questão do acesso à justiça e principalmente na assimetria desse acesso, o que resulta em questões de equidade e isonomia.

Essa judicialização normalmente desafia questões econômicas e de planejamento, resultando em problemas de ineficiência. Assim, por uma questão de legitimidade democrática, a escolha e a fiscalização das políticas públicas, defendeu, cabem aos agentes políticos eleitos e não aos juízes. Ressaltou, ainda, que em geral exemplos de tais políticas que deram certo foram conduzidas no âmbito da política institucional, com atuação dos Poderes Legislativo e do Executivo.

Na sequência, apontou que tem uma visão um pouco menos otimista que o Dr. Daniel no que diz respeito à judicialização política, mas reconheceu que o STF cumpriu seu importante papel de “segurar o bastão” da democracia, dado os últimos anos, mas que precisa “voltar para a casinha” da atuação judiciária. Destacou que não é bom para a democracia que o STF seja percebido como uma casa política.

Retomada a palavra pelo mediador, o Dr. Luiz Fernando Casagrande Pereira direcionou ao Dr. Sarmento a questão acerca da aparente extrapolação de competências do Supremo nos julgamentos relativos à descriminalização do aborto e do uso de maconha; questionando, também, sobre uma possível reação do Congresso Nacional à atuação da Corte, considerada a percepção de invasão da competência legislativa para tratar desses temas.

Sarmento, em resposta, frisou que o país já não vive um momento de crise existencial da democracia e que há princípios aos quais o Supremo deve se ater. No ponto, ressaltou o desrespeito aos limites de competência da Corte e a inobservância de princípios aos quais, segundo disse, ela deve voltar a olhar: o princípio acusatório no processo penal; o da livre distribuição dos processos; e o do duplo grau de jurisdição, por exemplo.

Falou-se, então, na real necessidade de a Corte retornar ao seu campo de atuação, sob a conclusão de que não se está, nem se pode falar de uma instituição soberana.

O palestrante defendeu, no entanto, a necessidade de se analisar a atuação do STF nos últimos anos dentro do contexto da época. Citando Thomas Jefferson, disse que a Constituição não é um pacto suicida e que não podia a Corte constitucional assistir ao país caminhar rumo ao abismo sem intervenção.

Quanto ao julgamento dos casos relativos ao aborto e à descriminalização da maconha, Sarmento retomou a importância de o STF defender direitos fundamentais e grupos vulnerabilizados, ambos implicados nos dois assuntos. Por esse motivo, disse não considerar haver abuso de atribuições pela Corte.

Encaminhado para a última exposição, o Dr. Gustavo apontou que uma construção institucional depende da legitimidade de pessoas que pensem seu sistema para além dos interesses políticos imediatos, que aprendam o espaço institucional do judiciário, em especial do STF.

Assim, finalizou sua fala apontando que no Brasil há um caminho pavimentado de um vício em judicialização, que tem efeito sistêmico de autorizar e legitimar atuações ativistas do Supremo em diversos setores. Com isso, apontou a necessidade de coerência em suas decisões, sendo imperioso aprender a perder e a ganhar na esfera política, reconhecendo seus espaços institucionais, uma vez que o Supremo não deve responder a incentivos políticos, mas sim exercer seu papel de defender a constituição.